sábado, 4 de julho de 2009

Centro antigo sustentável.




A Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), instituição com vasta experiência na reabilitação de Centros Históricos, assinou com o Governo do Estado da Bahia, nesta terça-feira, dia 22.04, um Projeto de Cooperação Técnica Internacional para a criação de uma estratégia de sustentabilidade para o Centro Histórico de Salvador (CAS). O acordo foi assinado no Salão de Atos da Governadoria, pelo Governador do Estado, Jaques Wagner, pelo Secretário de Cultura, Márcio Meirelles, e pelo representante da Unesco no Brasil, Vincent Defourny, com presença de outros secretários de estado, município, Organizações não-Governamentais (Ongs) e representantes da sociedade civil. Baseado na relação entre Cultura e Desenvolvimento, o Projeto de Cooperação Técnica Internacional (Prodoc) reconhece a importância da inclusão da cultura no planejamento urbano da cidade de Salvador e se propõe a criar alternativas para garantir a sustentabilidade econômica, física e social dos moradores que habitam o Centro Antigo. O acordo de cooperação técnica com a Unesco prevê a realização de pesquisas sócio-econômicas para o desenvolvimento de um projeto de reabilitação sustentável do CAS, que se integra às ações em curso, resultado do Convênio com o Ministério das Cidades. “A Unesco atuará na região do Centro Antigo de Salvador criando um ambiente que permita aos moradores manifestarem sua expressão cultural e diversidade criativa”, afirma o secretário de Cultura, Márcio Meirelles, que também é o presidente do Conselho Gestor do Centro Antigo, formado por seis secretários de Estado. De acordo com ele, os dados disponíveis hoje não são suficientes para explicar problemática da região. “Com as pesquisas inéditas que serão realizadas, poderemos fazer um planejamento mais específico das ações e desenvolver um projeto de longo prazo, que tenha em seu horizonte a sustentabilidade econômica e social”, explica. O projeto vai consolidar dados de natureza cultural, urbanística, fundiária, ambiental e sócio-econômica, com diagnósticos, análise da legislação, elaboração de planos e projetos que vão guiar as ações de revitalização das áreas envolvidas. Com esses levantamentos, também será possível obter um mapeamento qualificado dos agentes que atuam direta e indiretamente sobre a área, incluindo os moradores, proprietários de imóveis, o setor empresarial, a igreja e o setor público em todos os níveis. Escritório de Referência do Centro Antigo O Escritório de Referência do Centro Antigo de Salvador, coordenado pela arquiteta Beatriz Lima, é um espaço de conciliação de ações, propostas e programas com o objetivo de elaborar e implantar um plano estratégico de gestão com ações de curto, médio e longo prazo para o Pelourinho e seu entorno. Além de gerir as atividades de reforma, o Escritório também atua na captação de recursos necessários para viabilizar projetos e encaminhar as demandas locais. “O Centro Histórico é Patrimônio da Humanidade e essa parceria com a Unesco é uma oportunidade de articulação com objetivos comuns, exatamente no sentido de desenvolver estudos que possam ter uma linguagem mundial”, destaca Beatriz Lima. Na semana passada, o Grupo Executivo do Centro Histórico, formado por 18 representantes da União, Estado e Município, se reuniram para definir as estratégias e diretrizes para a implementação do Plano de Reabilitação Integrado e Participativo do Centro Antigo de Salvador, resultante do Acordo de Cooperação Técnica e do Convênio com o Ministério das Cidades. Representantes de diferentes ministérios e secretarias estaduais e municipais discutiram um modelo de sustentabilidade para a região, com o objetivo de promover um planejamento estratégico de gestão participativa que potencialize as atividades econômicas e culturais, as condições de habitação e infra-estrutura, tendo a Cultura como âncora. Na ocasião, foram apresentados os resultados das 51 ações emergenciais executadas para resolver os problemas imediatos do Pelourinho. Mais de 80% dessas ações foram executadas ou estão em execução e dizem respeito a problemas relativos à segurança pública, iluminação, coleta de lixo e programação cultural. “A gente percebe, por exemplo, que em termos de estatísticas, o Pelourinho é um dos lugares mais seguros e policiados da cidade. O que existe é uma sensação de insegurança, que nós já estamos combatendo com ações como a melhoria da iluminação”, afirma a gestora do Escritório de Referência do Centro Antigo, Beatriz Lima. Dois projetos emergenciais estão em andamento: a urbanização da Vila Nova Esperança (antiga Rocinha) e o plano de reabilitação da Baixa dos Sapateiros. O primeiro envolve a construção de 66 unidades de habitação e equipamentos comunitários como cozinha, sede da associação de moradores, oficina de instrumentos musicais, horta e biblioteca.
O contrato para elaboração do projeto foi assinado este mês com o arquiteto Marcelo Ferraz, e as obras terão início por volta do mês de julho. Um grupo de trabalho envolvendo a comunidade e representantes do Estado e da Prefeitura determinou as demandas da comunidade. As obras de urbanização da Vila Nova Esperança, no valor de R$6,5 milhões, serão realizadas através do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, numa parceria entre as secretarias estaduais de Cultura e de Desenvolvimento Urbano, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e a Prefeitura Municipal de Salvador. O segundo projeto, o Geor (Gestão Estratégica Orientada para Resultados) Varejo Vivo, tem como objetivo promover um desenvolvimento equilibrado e sustentado das micro e pequenas empresas da Baixa dos Sapateiros. Trata-se de uma das ações previstas no Plano de Reabilitação da Baixa dos Sapateiros, ou seja, o desenvolvimento de ações integradas para promover a reabilitação sustentável da “porta de entrada” do Centro Histórico, numa parceria do Governo do Estado, através da Secretaria de Cultura, com o Sebrae, o Fórum Municipal para o Desenvolvimento de Sustentável do Centro da Cidade e o Sindicado do Comércio Varejista. “Temos que trocar o pneu com o carro andando”, afirma Beatriz Lima, coordenadora do Escritório de Referência. Isto significa que enquanto são tomadas ações emergenciais para melhorar a situação do Centro Histórico, uma ação maior e estudada visa um modelo de gestão sustentável e participativo para todo o Centro Antigo de Salvador. Atualmente, estão sendo investidos mais de R$ 200 milhões em projetos de habitação social; recuperação de imóveis históricos para servidores públicos e atividades comerciais; recuperação de monumentos; manutenção de imóveis; e obras de infra-estrutura no Centro Antigo de Salvador. A maior parte dos recursos é da União, com contrapartida do Estado, através de diversos convênios e parcerias firmados entre o governo estadual e programas federais como o Monumenta, o Rememorar e o Prodetur, sem contar o programa estadual Morar Melhor. Perfil Beatriz Lima Gestora do Escritório de Referência do Centro Antigo de Salvador, Beatriz Lima é formada em arquitetura pela Universidade Federal da Bahia (Ufba) com pós e mestrado em Administração de Empresas. Beatriz assumiu o desafio de coordenar e articular as ações e projetos para a reabilitação do Pelourinho e seu entorno. Com larga experiência na área de reabilitação de centros das cidades brasileiras, foi diretora de Planejamento Habitacional da secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedur), tendo sido responsável pela coordenação e consultoria técnica de projetos e programas de recuperação do patrimônio cultural urbano brasileiro, a exemplo do Monumenta e do Rememorar. Em Brasília, ocupou o cargo de gerente nacional de prestação de serviços da Caixa Econômica Federal, coordenando e desenvolvendo novos projetos, programas e negócios. Na Bahia, foi gerente de desenvolvimento urbano da Caixa Econômica Federal e criou metodologia para utilização de recursos da Lei Rouanet voltados para habitação de interesse social, participando inclusive do desenvolvimento da Política Estadual de Habitação de Interesse Social da Bahia (PEHIS). Beatriz Lima participou de seminários internacionais na França, em Cuba e no Uruguai, onde fez palestras sobre os temas: programas urbanos, reabilitação de áreas urbanas centrais, meio ambiente e gerenciamento de programas e projetos. Pelourinho, Centro Histórico e Centro Antigo Conhecido antigamente como Bairro do Maciel, o Pelourinho é um conjunto arquitetônico tombado pela Unesco como Bem Cultural do Patrimônio Mundial, em 1985. Já o Centro Histórico, onde está situado o Pelourinho, engloba uma área maior, que vai do Mosteiro São Bento, na Avenida Sete, até o bairro de Santo Antônio Além do Carmo. Já o Centro Antigo de Salvador se estende por aproximadamente sete quilômetros quadrados, que vai do Campo Grande até o Barbalho, envolvendo o Comércio, o Dique do Tororó, a avenida Joana Angélica e Nazaré. Essas são as delimitações encontradas na Lei de Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo de Salvador. Na década de 60, deu-se início uma gestão estadual do turismo, marcada pela atuação de um Estado protagonista, paternalista e interventor. Com a criação do IPAC – Fundação Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia, foi elaborado um Plano Geral de Recuperação da Área do Pelourinho, primeiro projeto destinado a revitalização do lugar. O Plano não foi completamente executado, mas até 1970, foram realizadas algumas obras de restauro. Na mesma época, com a criação do CAB – Centro Administrativo da Bahia e o surgimento de novas centralidades urbanas, diversos organismos da administração municipal e estadual saem do Centro Histórico. O Teatro Alfredo de Brito, o Plano Inclinado Pilar, os cinemas Santos Antonio e Popular e 58 casas comerciais são fechados, acentuando o empobrecimento e declínio do Pelourinho. Em 1971, continua a restauração de alguns monumentos e fala-se na criação de um “corredor turístico”, onde os visitantes poderiam circular “protegidos” do contato com a marginalidade e a pobreza do entorno. A idéia foi rechaçada por nomes como Jorge Amado, Caribé, Calazans e Carlos Bastos. Na mesma década, começam as estratégias de marketing direcionadas para atrair público do Sul e Sudeste do Brasil. Nos anos 80, com as diversas crises econômicas enfrentadas pelo mundo, a fase expansionista do turismo baiano não teve continuidade. Houve dificuldade para se conseguir recursos para a execução do programa de recuperação do Centro Histórico, mas alguns projetos de sucesso foram realizados, a exemplo da Casa do Olodum e Casa do Benin, a cargo da arquitete Lina Bo Bardi.
A década de 90 inaugura uma nova fase para a região que é contemplada com a mais ampla proposta de recuperação do seu conjunto arquitetônico. O Centro Histórico, mais especificamente, o Pelourinho, sede de agremiações afrocarnavalescas e culturais, possibilitou a formação de um movimento de valorização e afirmação da cultura. A região ganha repercussão internacional graças a grupos como o Olodum que, após vender 50 mil cópias do seu primeiro LP, grava em 1990, um videoclipe com Paul Simon, exibido para cerca de 140 países. Na mesma época, o poder público atribui ao Centro Histórico uma conotação eminentemente empresarial, expulsando a comunidade local e quebrando as características e o sentido de bairro. A idéia era construir, entre o Terreiro de Jesus e o Largo do Pelourinho, um shopping center ao ar livre para turistas. A proposta teve pouco fôlego e, em 1994, já demonstrava sinais de dificuldades. Diferente do bairro vizinho, o Santo Antônio Além do Carmo, que teve um movimento natural de desenvolvimento de atividades comerciais e empresariais, com sustentabilidade, o Pelourinho foi marcado por uma política de intervenção vertical, hierárquica e autoritária, com foco no turismo e feito à custa de subsídios estatais, com doações de imóveis e cobrança de aluguéis irrisórios.

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